INTRODUÇÃO
Por Fernanda S.
Presente na maioria das sociedades, a
violência praticada pelo parceiro íntimo constitui a forma mais endêmica de
violência contra a mulher, no entanto não é reconhecida como forma de
violência, sendo muitas vezes aceita como fenômeno cultural, fazendo parte dos
costumes e normas da sociedade que entendem e aceitam a violência exercida
contra mulheres como forma de ação disciplinar exercida sobre esposas e filhas.
"Qualquer ato de violência baseado na diferença de gênero, que resulte em sofrimentos e danos físicos, sexuais e psicológicos da mulher; inclusive ameças de tais atos, coerção e privação da liberdade seja na vida pública ou privada". - Conselho Social e Econômico, Nações Unidas (1992).
Segundo estimativas do Banco Mundial, uma mulher tem maior probabilidade de ser
espancada, violada ou assassinada pelo seu parceiro atual ou anterior que por
um estranho. Embora não sejam dados conclusivos, estudos apontam a
gravidez como fator de risco para a violência doméstica, podendo esta ter
início depois da gestação ou alterar o padrão quanto à freqüência e gravidade
neste período. Estudos de revisão sobre prevalência de VD na gravidez indicam
uma estimativa de 0,9 a
20,1%, referindo a maioria dos estudos taxas entre 3,9 e 8,3% entre mulheres
grávidas investigadas (MENEZES, 2003).
Em um estudo realizado para
pesquisar a percepção da enfermagem a cerca da violência intrafamiliar em
gestantes, as conclusões expressaram a
necessidade de amplitude das reflexões relações da enfermeira obstétrica
saúde da população feminina, o uso de instrumentos para as mesmas como
identificação e abordagem direta a violência contra a gestante no âmbito
intrafamiliar, estudos científicos que explorem reflexões sobre as práticas da
enfermeira obstétrica frente a temática violência a mulher e sua repercussão
nas fases do seu ciclo vital, fortalecimento da temática nos cursos de
graduação em saúde, inclusão do tema nas escolas, a realização de análises e
acompanhamento dos casos atendidos com discussões multidisciplinares,
realização de grupos de educadores em saúde para conscientização para a equipe
de saúde, comunidade no aspecto compreensão
sobre direitos reprodutivos, violência à mulher na sua perspectiva de gênero na
família e os agravos à sociedade como um todo (MEDINA, 2008).
Lei Maria da Penha
Agredida pelo marido durante seis anos, Maria da
Penha foi vítima de duas tentativas de homicídio. Em uma delas, ficou
paraplégica. O agressor só foi punido após 19 anos e ficou apenas dois anos em
regime fechado.
A falta de rigor na lei brasileira na época dos
crimes levou o país a ser condenado pela Comissão Interamericana de Direitos
Humanos da OEA - órgão internacional responsável por julgar ações decorrentes
de violação de acordos internacionais.
Aprovada por unanimidade em 22 de setembro de 2006, a Lei 11340/06 – mais
conhecida como Lei Maria da Penha – foi criada com a finalidade de coibir a
violência doméstica contra a mulher. Contém ainda propostas de medidas de
prevenção, assistência e proteção às mulheres vítimas de violência.
A Lei propõe a criação de varas especializadas em
violência doméstica e ainda procedimentos específicos para lidar com o tema,
dentro da Lei nº 9.099. Além disso, prevê o encaminhamento de mulheres em situação
de violência e seus dependentes a programas e serviços de proteção, garantindo
os diretos à guarda dos filhos e a seus bens. Trata também do processo da volta
para o lar, ou seja, a recondução da mulher a sua residência depois do
afastamento do agressor.
De acordo com dados da Secretaria Especial de
Políticas para as Mulheres (SPM), foram instaurados 32.630 inquéritos
policiais, 10.450 processos criminais, 864 prisões em flagrante e 77
preventivas durante os primeiros oito meses de vigência da nova lei (out/2006 a
maio/2007).
Discussão
em jornal da Unicamp, tendo como tema “Nem gestantes são poupadas da violência
doméstica”
Por Manuel Alves Filho da tese de doutorado em Saúde Coletiva
1.379 mulheres gestantes que realizaram o acompanhamento pré-natal nas unidades
públicas de saúde, no período de 2004
a 2006 em Campinas divulgou no estudo que: a cada 6 mulheres, uma é vitima de qualquer tipo de violência na
Região Sudoeste de Campinas.
Das 1.379 mulheres grávidas que realizaram o pré - natal
nas unidades públicas de saúde de Campinas: 19,1% disseram ser vitimas de
violência psicológica mediada por ofensas, intimidações e atos que causam
humilhação, 6,5% disseram ter sido vítimas de violência física ou sexual por
parceiros usuários drogas e álcool mais de uma vez na semana.
De acordo com a autora a lei Maria da Penha traz
benefícios, mas, que ainda há carência de mecanismos adequados para assistir a
gestante vitima de violência (AUDI, 2007).
Pacto Nacional pelo Enfrentamento à Violência contra
as Mulheres
O objetivo do Pacto é prevenir e combater todo tipo
de violência contra as mulheres e garantir seus direitos. Segundo a Secretaria
Especial de Políticas para a Mulher, até 2011 serão aplicados R$ 1 bilhão em
quatro áreas estratégicas: consolidação da Política Nacional de Enfrentamento à
Violência contra as Mulheres e implementação da Lei Maria da Penha; Promoção
dos Direitos Sexuais e Reprodutivos das Mulheres; Combate à Exploração Sexual
de Meninas e Adolescentes e ao Tráfico de Mulheres; Promoção dos Direitos
Humanos das Mulheres em Situação de Prisão.
Entre as ações previstas pelo Pacto, estão a
construção, reforma e reaparelhamento de mais de 700 serviços especializados de
atendimento à mulher (delegacias, defensorias, centros de referência, etc.), a
capacitação policiais e profissionais de educação e a realização de campanhas
educativas e culturais de prevenção à violência de gênero.
O Pacto também é responsável pela instalação do
Observatório de Monitoramento da Implementação e Aplicação da Lei Maria da
Penha, melhoria das condições de encarceramento feminino, projetos inovadores
de enfrentamento da violência sexual contra crianças e adolescentes e
implantação de uma metodologia de atendimento às mulheres vítimas de tráfico,
entre outras medidas.
Atendendo às mulheres
O governo federal criou uma Central de Atendimento à
Mulher – Ligue 180, um serviço gratuito de orientação sobre o enfrentamento à
violência à mulher, questões de gênero e informações sobre as políticas do
governo federal voltadas às mulheres. O serviço funciona 24 horas por dia,
todos os dias da semana (inclusive feriados) e pode ser acessado de qualquer
parte do Brasil.
No mês de novembro de 2007, por exemplo, o Ligue 180
registrou 24.849 atendimentos, dentre os quais 1.632 foram relatos de
violência.
Secretaria
Municipal de Integração Social
Mulher
Vítima de Violência
Quando a mulher vitimizada toma a decisão
de se encaminhar à Delegacia de Defesa da Mulher e comunicar uma agressão
sofrida, precisa de um aparato que a proteja e apóie. Jundiaí oferece, desde
fevereiro de 2006 um abrigo (Casa Sol) para protegê-la (e a seus filhos), e um
corpo técnico para apoiá-la sócio-emocionalmente na decisão que tomar. É comum
a mulher, após a elaboração do Termo Circunstanciado, retornar à Delegacia ou,
quando chamada no Fórum local, “desistir” ou “abandonar” o processo por medo,
por não ter rendimento próprio, por pressão emocional de familiares, dentre
outros motivos. Com este equipamento, abrigada com segurança e com endereço
sigiloso (protegida) e apoio de técnicos, ela encontrará caminhos para uma nova
“existência” e para buscar formas positivas de vida.
Com capacidade de atendimento para 10
mulheres vitimizadas, o atendimento tem início após decisão e encaminhamento da
Delegacia de Defesa da Mulher de Jundiaí, que definirá a necessidade do
abrigamento. O tempo de permanência na Casa depende dos encaminhamentos
realizados, tanto na esfera judicial como do atendimento sócio-emocional.
• Serviços de saúde materno-infantil.
Como a violência é pelo menos tão comum e, às
vezes, mais grave do que uma variedade de outras condições para as quais os
profissionais de saúde fazem triagens rotineiras durante a gravidez, a maioria
dos especialistas considera que todas as mulheres atendidas no pré-natal
deveriam passar por triagem para detectar abuso doméstico. O ambiente do
atendimento pré-natal é particularmente adequado à discussão sobre o abuso
porque a confiança das mulheres vai aumentando a cada nova visita. A triagem
pós-parto também é importante, já que a violência pode aumentar em freqüência
ou gravidade depois do parto. As consultas pediátricas e de puericultura
oferecem também uma boa oportunidade para identificar e oferecer apoio às mães
e crianças que experimentam a violência no lar.
Realmente, o
ideal seria que os profissionais de saúde coordenassem suas ações com os
serviços comunitários, entre eles os grupos locais de mulheres, mas existem
muitas ações que os profissionais de saúde podem executar imediatamente durante
a visita à clínica:
1. Avaliar o perigo
imediato.
Procure saber se a mulher acha que ela ou seus
filhos correm perigo imediato. Se for este o caso, ajude-a a pensar em vários
cursos possíveis de ação. Ela teria um amigo ou parente que poderia ajudá-la?
Se houver um abrigo de mulheres ou um centro de atendimento de emergência na
área, ofereça-se para entrar em contato com eles. Alguns hospitais e clínicas
têm diretrizes explícitas para permitir que as mulheres que sofrem abuso
doméstico passem a noite no hospital se não se sentirem seguras em voltar para
casa, mas o abandono temporário de um parceiro violento não acaba
necessariamente com a violência. O momento mais perigoso de uma mulher junto a
um parceiro violento é geralmente logo depois que ela decidir sair de casa ou
terminar o relacionamento .
2. Oferecer o atendimento adequado.
Para as mulheres que sofreram agressão sexual, o
atendimento mais adequado poderá incluir a contracepção de emergência e o
tratamento preventivo da gonorréia, sífilis ou outras DST prevalentes no local.
Exceto se houver necessidade inquestionável, os clínicos devem evitar receitar
tranqüilizantes e drogas que alteram o estado emocional das mulheres que
convivem com parceiros abusivos, pois este tipo de droga pode prejudicar sua
capacidade para prever e reagir aos ataques dos parceiros.
Alguns serviços de atendimento de saúde documentam adequadamente os casos de abuso contra mulheres. Em Joanesburgo, na África do Sul, uma avaliação constatou que, em 78% dos casos de abuso, os serviços não tinham registrado a identidade do agressor. Os registros clínicos incluíam descrições realistas porém generalizadas, tais como “recebeu golpes de machado“ ou “foi apunhalada“.
Uma documentação cuidadosa dos sintomas ou lesões sofridos pelas mulheres, bem como de seu histórico de abuso, é útil para o acompanhamento médico futuro. A documentação também é importante caso a mulher decida posteriormente apresentar queixas contra o agressor ou conseguir a guarda dos filhos. A documentação deve ser a mais completa possível, dela constando claramente a identidade do agressor e seu relacionamento com a vítima.
4. Preparar um plano de proteção.
Apesar das mulheres não poderem evitar a reincidência dos atos de violência e não estarem dispostas a dar queixas à polícia, existem formas para se protegerem e aos seus filhos. Elas podem manter uma sacola pronta com documentos importantes, chaves e uma muda de roupa ou podem criar um sistema de código para indicar aos filhos o momento em que necessitam pedir ajuda a algum vizinho. Os serviços de saúde devem discutir um plano típico de proteção com a mulher e decidir com ela que ações poderiam ser adotadas para ajudá-la a resolver sua situação. Um boa técnica é afixar descrições de planos típicos de proteção nas paredes dos banheiros das clínicas e salas de exame médico, onde as mulheres podem lê-los sem sentir embaraço.
5. Informar às mulheres os seus direitos.
Quando uma mulher toma a decisão de revelar sua situação a outros, é essencial que os profissionais de saúde enfatizem que a violência não é sua culpa e que ninguém merece ser agredida ou estuprada. Os códigos penais da maior parte dos países consideram o estupro e a agressão física como crimes, mesmo que não existam leis específicas contra a violência doméstica. O pessoal de saúde deve procurar se informar sobre as proteções legais que existem para as vítimas do abuso e onde as mulheres e crianças podem procurar ajuda na defesa de seus direitos.
6. Encaminhar as mulheres às instalações e serviços comunitários.
Os profissionais de saúde podem ajudar as vítimas do abuso identificando-as o mais rápido possível e encaminhando-as aos serviços comunitários que estejam disponíveis. As necessidades das vítimas geralmente são superiores ao atendimento que o sistema normal de saúde pode proporcionar. Por isso é essencial que os profissionais de saúde saibam com antecedência que outros recursos estão disponíveis para ajudar as vítimas do abuso. É particularmente útil para os profissionais de saúde conhecerem pessoalmente as pessoas e instalações que prestam serviços às vítimas da violência, pois estarão mais propensos a encaminhar uma cliente a alguém que conhecem.
INTERVENÇÃO DE ENFERMAGEM
As unidades de saúde e os hospitais de referência
devem estabelecer fluxos internos de atendimento, definindo profissional
responsável por cada etapa da atenção; Isso deve incluir entrevista, registro
da história, exame clínico e ginecológico, exames complementares e acompanhamento
psicológico. Também deve estar incluso no processo de atenção à mulher
condições especiais, como intervenções de emergência ou internação hospitalar.
As mulheres em situação de violência sexual devem ser
informadas pelo enfermeiro responsável pela unidade, sempre que possível sobre
tudo o que será realizado em cada etapa do atendimento e a importância de cada
medida. Sua autonomia deve ser respeitada, acatando-se a eventual recusa de
algum procedimento e o enfermeiro deve encaminhá-la para um atendimento
psicológico onde medidas de fortalecimento serão dadas e essa mulher,
ajudando-a a enfrentar os conflitos e os problemas inerentes à situação vivida.
FASES A SEREM SEGUIDAS PELO ENFERMEIRO
REGISTRO DE ENCAMINHAMENTO
Registrar em prontuário:
1. Local, dia e hora aproximada da violência sexual;
2. Tipo de violência sexual sofrida;
3. Forma de constrangimento utilizada;
4. Tipificação e número de agressores;
5. Órgão que realizou o encaminhamento.
PROVIDÊNCIAS INSTITUÍDAS
Verificar eventuais medidas prévias:
1. Atendimento de emergência em outro serviço de saúde e
medidas de proteção realizadas;
2. Realização do Boletim de Ocorrência Policial;
3. Realização do exame pericial de Corpo de Delito e
Conjunção Carnal;
4. Comunicação ao Conselho Tutelar ou à Vara da Infância
e da Juventude (para crianças e adolescentes);
5. Realização de exames laboratoriais;
6. Outras medidas legais cabíveis.
COMO O ENFERMEIRO DEVE AVALIAR AS SITUAÇÕES DE RISCO
A avaliação dos riscos deverá ser feita junto com a
usuária. É preciso identificar as situações de maior vulnerabilidade, a fim de
elaborar estratégias preventivas de atuação. Nos casos de famílias em situação
de violência, o enfermeiro deve-se observar a história da pessoa agredida, o
histórico de violência na família e a descrição dos atos de violência. O
enfermeiro também deve avaliar os riscos de repetição ou agravamento, visando à
prevenção de novos episódios. Quando se tratar de criança, adolescente ou
pessoa em condição de dependência em relação ao agressor é importante avaliar a
necessidade de estabelecer mecanismos de intervenção que atenuem a dependência
e a vulnerabilidade.
No caso específico de violência sexual, é necessário
alertar a pessoa quanto a medidas de proteção individual, formas de defesa e,
sobretudo, orientar condutas que evitem maior dano. Se a violência contra a
mulher é perpetrada por parceiro íntimo, é preciso avaliar a necessidade de
acompanhamento e proteção, no sentido de garantir socorro e abrigo a esta e aos
filhos, quando necessário (por exemplo, casa abrigo), principalmente a partir
do momento em que ela decida denunciar o companheiro ou romper a relação.
REFERÊNCIAS
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Econômico, Nações Unidas, 1992. Relatório do Trabalho de Grupo na Violência
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MENEZES, T. C.; AMORIM, et al. Violência
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BANDURA, A. Self-efficacy mechanism in human
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MINISTÉRIO DA SAÚDE, Manual
Secretaria de Atenção à Saúde,Departamento de Ações Programáticas Estratégicas:
Direitos sexuais, direitos reprodutivos e métodos anticoncepcionais. Brasília : Ministério da Saúde, 2006.
MEDINA, A.B.C., PENA, L.H.G. A percepção de enfermeiras
obstétricas acerca da violência intrafamiliar em mulheres grávidas. Revista & Contexto Enfermagem, Santa
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http://redalyc.uaemex.mx/redalyc/pdf/714/71417309.pdf>. Acesso em 11 de
Outubro de 2009.
AUDI, C. A. F. Nem gestantes
são poupadas da violência doméstica Faculdade de Ciências Médicas (FCM) da Unicamp. Jornal
da Unicamp, 09/10/07. http://www.violenciamulher.org.br/reportagens-artigos-e-outros-textos.
Acessado em 10/10/2009
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